Nos meus saudosos tempos de menino, até os 15 anos vividos na roça, vida enriquecida de sol e pelo verdor das florestas ainda virgens; quando havia a possibilidade, hoje extinta, de se ouvir os pássaros a cantar uma variedade imensa de trinados, as lavouras variadas, bem diferentes das que hoje vicejam em meus pagos infantis, constituídas exclusivamente por canaviais e mais canaviais, em seu verde desmaiado sem fim; quando a escola era carinhosa, pois carinhosos eram os mestres ou as mestras; quando o leite matinal vinha direto dos úberes animais das cabras ou das vacas, direto para a fervura no fogão de lenha sempre a crepitar; quando as crianças, os garotos, as garotas, os jovens e mesmo os casados ouviam a voz dos pais e obedeciam aos seus conselhos; quando os domingos e dias de guarda eram respeitados, com a suspensão do trabalho de qualquer gênero, aproveitados para diversão sadia e feliz; quando eu me encantava diante da banda musical do bairro, como algo muito importante e demonstrativo de avançada cultura; quando as famílias se constituíam verdadeiras, casamentos realmente unidos e abençoados por Deus; quando tudo isso acontecia, tinha-se a presença da Fé a se insinuar na alma e coração da garotada, transmitida por pessoas idosas ou senhoras de experiência e conhecimentos religiosos mais destacados, vindos de um passado feito de vontade de aprender e ensinar Deus.
Assim, aprendi a “ser cristão pela graça de Deus”. As catequistas (sempre as havia dotadas de muita boa vontade) era assim também que começavam a ensinar o catecismo católico, apostólico, romano, perguntando ao aprendiz: “És cristão?” Ao que respondia: “Sim sou cristão pela graça de Deus”. “E o que é ser cristão?” reiterava a catequista? E vinha a resposta na ponta da língua:”Ser cristão é amar a Deus, ao próximo como a si mesmo, aprender e cumprir os seus 10 mandamentos; observar os mandamentos da Igreja; ser temente a Deus, orar e, ao casar-se, receber todos e tantos filhos quantos Deus mandar.”
O Catecismo era uma síntese da vida de um cristão que quisesse pertencer à Igreja religiosa do Deus verdadeiro. Nele resumiam-se direitos e deveres dos que nela se integravam pelo Batismo e ao término da vida, recebiam a Extrema Unção, para que adentrassem o Céu ungidos e consagrados.
Infelizmente, ao que vejo e todos quantos se propuserem a observar, verão igualmente, a religião está muito esquecida pela sociedade moderna. Parece-nos que o importante Catecismo de tempos idos, foi colocado na estante dos livros que não mais se usam e o “És Cristão?” de outrora o acompanhou nesse esquecimento infeliz.
Hoje nos parece também que muitos e muitos observam uma religião a seu modo, segundo os seus critérios sociais e interesseiros, dando mais importância e mais atenções a uma reunião do clube social do que à obrigação da missa dominical e confissão anual. Os noivos vão ao altar procurando mais realçar as exterioridades sociais, antes que a importância do Sacramento do Matrimônio, parecendo estar mais interessados na presença dos amigos e curiosos do que na palavra do sacerdote que opera o ato sacramental, em ouvir o “sim” da boca antes do que o sim do coração, o “sim” de Deus que lhes envia sua bênção e lhes anuncia a felicidade mútua, em amar a voz do órgão ou do violino antes que o coro dos anjos que assistem do Céu a ato tão solene e promissor. O Sacramento do Batismo transforma-se em festa do círculo de relações de amizade, ao invés de um importante fato que assinala o ingresso do batizando na “sociedade” cristã da Igreja.
E assim, os demais sacramentos e mandamentos. Dá-se-lhes mais valor social do que valor religioso e divino.
Será que se fôssemos proferir o velho “És Cristão?” no seio da moderna sociedade, iríamos ouvir a não menos velha resposta: “Sim sou cristão pela graça de Deus”? Ou haveria um silêncio comprometedor e indagador: “O que é isso, meu amigo?”
Com sua lente observativa, distinto amigo(a), percorre as diversas camadas humanas da sociedade para verificar a quantas andam as relações celestiais de Deus com seus filhos terrenos. Certamente te surpreenderás, diante de uma sociedade amorfa à Fé, ao conhecimento de Deus, à prática da religião, à observância e obediência aos mandamentos e sacramentos, à oração, ao amor a Deus e ao próximo. Sinal dos tempos dirão aqueles que querem se eximir de culpa, dever dos padres afirmarão outros que querem ter vigários como se santos em vida fossem.
Falta de Catecismo digo eu, daquele livrinho simples mas profundo que as senhoras idosas de meus tempos infantis ensinavam com dedicação e santidade: “És cristão? Sim, sou cristão pela graça de Deus...” Etc... etc...
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